quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O cérebro humano mede o tempo por meio da observação dos movimentos.

Se alguém colocar você dentro de uma sala branca vazia, sem nenhuma mobília, sem portas ou janelas, sem relógio.... você começaria perder a noção do tempo.
Por alguns dias, sua mente detectaria passagem do tempo sentindo as reações internas do seu corpo, incluindo os batimentos cardíacos, ciclos de sono, fome, sede e pressão sanguínea.

Isso acontece porque nossa noção de passagem do tempo deriva do movimento dos objetos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos, como o nascer e o pôr do sol.

Compreendido este ponto, há outra coisa que você tem que considerar:

Nosso cérebro é extremamente otimizado.

Ele evita fazer duas vezes o mesmo trabalho.
Um adulto médio tem entre 40 e 60 mil pensamentos por dia.
Qualquer um de nós ficaria louco se o cérebro tivesse que processar conscientemente tal quantidade.

Por isso, a maior parte destes pensamentos é automatizada e não aparece no índice de eventos do dia e portanto, quando você vive uma experiência pela primeira vez, ele dedica muitos recursos para compreender o que está acontecendo.
É quando você se sente mais vivo.

Conforme a mesma experiência vai se repetindo, ele vai simplesmente colocando suas reações no modo
automático e 'apagando' as experiências duplicadas.
Se você entendeu estes dois pontos, já vai compreender porque parece que o tempo acelera, quando ficamos mais velhos e porque os Natais chegam cada vez mais rapidamente.
Quando começamos a dirigir automóveis, tudo parece muito complicado, nossa atenção parece ser requisitada ao máximo.

Então, um dia dirigimos trocando de marcha, olhando os semáforos, lendo os sinais ou até falando ao celular ao mesmo tempo.
Como acontece?
Simples: o cérebro já sabe o que está escrito nas placas (você não lê com os olhos, mas com a imagem anterior, na mente); O cérebro já sabe qual marcha trocar (ele simplesmente pega suas experiências passadas e usa , no lugar de repetir realmente a experiência).
Ou seja, você não vivenciou aquela experiência, pelo menos para a mente. Aqueles críticos segundos de troca de marcha, leitura de placa são apagados de sua noção de passagem do tempo.
Quando você começa a repetir algo exatamente igual, a mente apaga a experiência repetida.

Conforme envelhecemos as coisas começam a se repetir - as mesmas ruas, pessoas, problemas, desafios, programas de televisão, reclamações, -.... enfim... as experiências novas (aquelas que fazem a mente parar e pensar de verdade, fazendo com que seu dia pareça ter sido longo e cheio de novidades), vão diminuindo.

Até que tanta coisa se repete que fica difícil dizer o que tivemos de novidade na semana, no ano ou, para algumas pessoas, na década.

Em outras palavras, o que faz o tempo parecer que acelera é a...
ROTINA

A rotina é essencial para a vida e otimiza muita coisa, mas a maioria das pessoas ama tanto a rotina que, ao longo da vida, seu diário acaba sendo um livro de um só capítulo, repetido todos os anos.

Felizmente há um antídoto para a aceleração do
tempo: M & M(Mude e Marque).

Mude, fazendo algo diferente e marque, fazendo um ritual, uma festa ou
registros com fotos.
Aprenda uma nova lígua, ou um novo instrumento

Mude de paisagem, tire férias com a família (
sugiro que você tire férias sempre e, preferencialmente, para um lugar quente, um ano, e frio no seguinte) e marque com fotos, cartões postais e cartas.

Tenha filhos ou animais de estimação (eles destroem a rotina)

Sempre faça festas de aniversário para você(marcando o evento e diferenciando o dia).
Use e abuse dos rituais para tornar momentos especiais diferentes de momentos usuais.

Faça festas de noivado, casamento, 15 anos, bodas disso ou daquilo, bota-foras, participe do aniversário de formatura de sua turma, visite parentes distantes, entre na universidade com 60 anos, troque a cor do cabelo, deixe a barba, tire a barba, compre enfeites diferentes no Natal, vá a shows, cozinhe uma receita nova, tirada de um livro novo.

Escolha roupas diferentes, não pinte a casa da mesma cor, faça diferente.


Beije diferente sua paixão e viva com ela momentos diferentes.
Vá a mercados diferentes, leia livros diferentes, busque experiências diferentes.
Seja Diferente!

Se você tiver dinheiro, especialmente se já estiver aposentado, vá com seu marido, esposa ou amigos para outras cidades ou países, veja outras culturas, visite museus estranhos, deguste pratos esquisitos.... em outras palavras... V-I-V-A. !!!
Porque se você viver intensamente as diferenças, o tempo vai parecer mais longo.

E se tiver a sorte de estar casado(a) com alguém disposto(a) a viver e buscar coisas diferentes, seu livro será muito mais longo, muito mais interessante e muito mais vivo... do que a maioria dos livros da vida que existem por aí.


Cerque-se de amigos.
Amigos com gostos diferentes, vindos de lugares diferentes e que gostam de comidas diferentes.

Enfim, acho que você já entendeu o recado, não ?
Boa sorte em suas experiências para expandir seu tempo, com qualidade, emoção, rituais e vida.

E
SCREVA em Tamanhos diferentes em Cores
diferentes!
CRIE, RECORTE, PINTE, RASGUE, MOLHE, DOBRE,PICOTE, INVENTE, REINVENTE...

V I V A !!!

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Visitas à velha senhora - crônicas de Lya Luft

"Alguma dura experiência me ensinou que nem sempre a vida é o bem supremo: o bem supremo seria uma vida em que, em qualquer idade, houvesse espaço para afetos e projetos.
Mesmo na avançada velhice, havendo exercícios de ternura e algum desejo – ainda que admirar a paisagem pela janela - , a vida valeria a pena.
Para que não pensem que meu olhar otimista ignora o lado da sombra, relato aqui um pouco das minhas inúteis e profundamente tristes visitas a uma velha dama, para quem há vários anos me tornei apenas isso: uma desconhecida que está de passagem.
Primeiro eu a encontrava em seu apartamento com os móveis pessoais e objetos de antigamente. Depois passei a vê-la no quarto da clínica onde recebe cuidados que em casa já era impossível dar. Seu universo reduzira-se ao mundo interior: ali comemorava quinze anos, ali era noiva ou tinha um bebê.
Geralmente ostentava um sereno ar de devaneio; em certas horas dialogava enfaticamente com quem só podia ver.
Mais bem humorada na alienação da que nos últimos anos de lucidez ameaçada, que eventualmente a assustava muito muito.
  • Você acha que eu estou ficando doida?
  • Claro que não, mas que bobagem. Todo mundo às vezes se esquece, ou faz qualquer coisa que depois parece esquisita.
Mesmo na clínica, em certos momentos parecia a elegante anfitriã que um dia fora: “Você quer um chá?”, perguntava duas, cinco, dez vezes, não por insistência mas porque ao indagar já o esquecia. Era um lampejo da que outrora recebia amigos na sua sala entre velhos tapetes persas e vasos de cristal onde floresciam como requintadas esculturas as inesquecíveis rosas do seu jardim, de nomes hieráticos e belos.
No começo me reconhecia, para logo me confundir com outras pessoas; depois nunca mais percebeu quem eu era. O se, primeiro numa paisagem esfumaçada, nos últimos anos em praticamente nada. Limbo.
O que sonha, na redoma da sua desmemória? Quando inventa palavras, o que realmente quer dizer... ou não quer dizer mais nada?
Embora dominada pela enfermidade que lhe trava cérebro e corpo, ela resiste ao tempo e ao meu desejo de ao menos mais algum contato – resiste até mesmo à morte.
Às vezes eu a pressinto, a Senhora Morte, à espreita num canto do aposento. Preguiçosa ou cruel, lixa as longas unhas roxas e cobre a cara com seus cabelos brancos de melancólica Rapunzel. Tem tempo, sabe esperar – espera demais.
Aconchegada na sua cápsula do tempo, da última vez que estive com a velha dama, ela, que há muito não falava, entreabriu os olhos e disse baixinho para si mesma, para alguém – para ninguém:
  • Que bom estar assim, tão leve e tão jovem.
E vou a enrolar-se no xale do seu enigma.
Um dia finalmente a Senhora Morte há de se compadecer: sem dor nem alarde soprará a chamazinha tênue, fechando a última porta desse corredor demasiado, e levará consigo essa que apenas perdura.
Mas o riso alegre, o passo enérgico, o perfume, a voz – e aquelas rosas – permanecerão comigo: imagens inapagáveis de quem na verdade já partiu, mesmo que ainda não tenham baixado todas as cortinas."
LUFT, Lia. Pensar é transgredir. Rio de Janeiro e São Paulo, Ed. Record, 2005

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

"Um olhar de Shakespeare sobre o tempo"

"Lesto o precioso tempo-olha o quadrante-foge
Hás de ao espelho inda ver tua beleza em declínio.
Cada ruga, então, vista e em que não pensas hoje.
Far-te-á pensar em campa  e esquecer teu fascínio,
E na sombra verás do teu quadrante o rumo
Do tempo, que, ladrão, vai para a eternidade.
Se fores ao papel confiando o que há de sumo.
No teu viver de agora, um livro hás de, em verdade,
Vir a ter ante o olhar: a tua própria história,
Escreve, escreve, pois, de modo qeu algum dia,
Do teu cérebro filha, haja, viva, a memória.
Da tua mocidade a esplender galhardia.
E, gozando em teu livro o argumento proveito,
Hás de tê-lo, decerto, em conta de alto jeito."


Sonetos de William Shakespeare, 1564-1616
São Paulo: Martin Claret, 2006 ( Coleção A Obra Prima de Cada Autor, 249) . Literatura Inglesa, pág. 103